Rosely Sayão
[...] Não é de hoje que as crianças têm maus exemplos dos adultos; aliás, é no mundo adulto que estão as mazelas do mundo
Uma leitora que tem filhos de oito e nove anos está preocupada, como muitos outros pais, com o impacto que a violência urbana e a falta de ética pública têm sobre a formação e o comportamento das crianças e quer saber como tratar a questão.
Uma leitora que tem filhos de oito e nove anos está preocupada, como muitos outros pais, com o impacto que a violência urbana e a falta de ética pública têm sobre a formação e o comportamento das crianças e quer saber como tratar a questão.
Ela diz que não há como escapar: mesmo acidentalmente, os filhos assistem a noticiários que mostram cenas de violência e ouvem colegas contarem histórias de assaltos sofridos pelos pais. Além disso, diz que percebe que exemplos negativos expostos pela mídia, como policiais e políticos envolvidos em corrupção, são absorvidos pelas crianças.
Ela cita exemplos para mostrar que sua preocupação faz sentido. Um dos filhos fez uma redação na escola em que o desfecho da história é a polícia ser dominada por ladrões; o outro contou que uma das brincadeiras prediletas no recreio é a busca de um tesouro imaginário, e os colegas que atrapalham a descoberta são amarrados -imaginariamente, é claro.
E tem mais: os filhos brincam de pegar dinheiro e esconder nas meias, por exemplo.
Isso me lembrou uma conversa que tive com um pai. Ele me disse que considerava até salutar que brincadeiras infantis colocassem o bem contra o mal, mesmo que dramatizassem a violência. O maior problema, para ele, era que percebia ser cada vez mais comum o mal vencer o bem no fim.
Uma constatação que já fiz é a de que muitas crianças se orgulham de serem maus alunos ou de terem comportamentos agressivos mesmo quando penalizados por isso, e de que outros se constrangem pela dedicação ao estudo porque são tachados de "nerds". Não é de hoje que as crianças têm maus exemplos dos adultos.
Aliás, é no mundo adulto que se localizam as mazelas do mundo. Neste, a violência sempre esteve presente, tanto quanto a corrupção. Hoje, talvez sejam mais expostas publicamente, e, como as crianças estão mais expostas ao mundo adulto, de fato estão mais vulneráveis a esses eventos. A questão de nossa leitora é como tratar isso com as crianças.
Em primeiro lugar, é importante que, sempre que os filhos se refiram ou tenham contato com fatos desse tipo, os pais manifestem sua opinião sobre eles. Para muitos, parece óbvio que as crianças entenderão como fato negativo. Pode ser, mas, para que não o absorvam, precisam das palavras orientadoras de seus pais.
Os pais também podem apontar as pessoas envolvidas em situações de violência e corrupção como exemplos a não serem seguidos porque, afinal, a vida deve ser vivida com ética e respeito.
Mas o mais importante é que os pais ensinem e cultivem em seus filhos as virtudes. Num mundo individualista, competitivo e de grande anseio de consumo, qualidades como compromisso, justiça, generosidade, compaixão, gratidão, humildade, simplicidade, tolerância e doçura, entre outras, parece que perderam sentido. Não: são as virtudes que possibilitam uma vida boa com os outros e isso é essencial para uma boa vida pessoal.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
Jornal Folha de S.Paulo, de 10/12/2009
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